terça-feira, 28 de julho de 2009

Becco da Forçada

O Jesus que é António, ou António de Jesus,
forçava a conversa, engonhava,
mal lhe saía palavra tropeçava e catrapuz.
Alice Fina, amiga e delicada, fingiu que não percebia,
convidou-o a passear, levou-o ao museu que acabava de estrear.
António de Jesus ficou desapontado, não percebia nada d’arte,
queria sim era aprender essa coisa a que chamam a Arte de amar:
Débora Pardal enfeitiçara-o, tirava-lhe o sono de dia,
que de noite? nem dormia, a imaginar-se com ela lá no Becco da Forçada.
E atropelava palavras, era-lhe difícil expor-se,
ele era desajeitado, só falava banalês,
só palavras corriqueiras embora fosse cortês .
Precisava duma ajuda, que a amiga o socorresse nesta sua aflição.
Alice ouviu-o, sentiu compaixão procurou ajudar, foi dali à sua amiga
e esforçou-se ao pedir: “Débora presta atenção,
o António de Jesus traz-te no coração.
Dá dó só de vê-lo, faz que fala e não fala, desembrulha a sua
alma como algodão em novelo”.
Ao que Débora troçou despregada: «eu que amei toda a vida só não quero
é um par, vou já mudar de casa só para ele me amar!»
E foi ter com o rapaz, que calada não podia:
«Ai António, ai Jesus, ai António de Jesus,
Que queres tu na fiada?
Banalizarmo-nos os dois, ficar a casa arrumada?
Mas que coisa tão forçada...»
E é que António nem tugiu?? engoliu o clique e zut!
Foi um alívio daqueles! Dois dias naquela canseira?
Que seria a vida inteira?!
António partiu para sempre. Nunca mais ninguém o viu,
Lá no Becco da Forçada.

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Travessa do Passarinho

António de Jesus empertigou-se na cadeira, levou a mão direita com vagar até à sua cabecita de alfinete, abriu os dedos e puxou o mais que pôde a melena para trás, enquanto inspirava uma lufada de ar, até bem ao fundo de si. Descruzou as pernas e com passo de gingão assomou-se à porta da barbearia. Tinha faro. Isso é que tinha. E algo lhe fez acordar o seu sentido de alerta. Havia pássaro novo lá no bairro. Pressentia-o. Cheirava-o à distância. Desde pequeno que o mais leve perfume no ar lhe eriçava os pelos. Só pelo cheiro sabia-lhe logo a côr da pele, a altura, a longura dos cabelos, a esguiesa das pernas e a idade do bicho. Pássaro novo não. Passarinha. Que ele era homem e muito macho. Mas aquele odor era algo que ele nunca tinha sentido até então. Era quente, salgado e ligeiramente acidulado. Trazia os ares do deserto e as neves frias das montanhas. Era endiabrado e solene. Saltimbanco e realeza. Preto e branco. Tudo e nada. Já tinha cheirado pássaras de todas as formas e feitios. Novas, mornas, doces, melosas, estouvadas, envergonhadas, de cabelos compridos, com buço, mas aquele cheiro que sentia agora lá ao longe, nunca. Ofuscava todos os outros odores dos quais aprendera os nomes. Asomou-se à porta estonteado. Inspirou fundo novamente. Algo começou a subir por ele e a acordar cada milimetro da sua pele. Arrepiou-se e deixou-se levar por aquela sensação desconhecida que lhe alterava todos os sentidos. Deixou que aquilo lhe tirarasse os pés do chão. É isso. Exclamou. Só pode ser. Não há dúvida. Disse em voz sonora, excitado com a descoberta e efusivo a sentir a cabeça andar à roda. Pela primeira vez, nos seus quase 31 anos, que faria com a graça de Deus já na próxima terça-feira, farejava aquilo de que muito tinha ouvido falar. Estava zonzo e abananado. Acabara de o sentir a pulsar em todos os seus poros. Era o cheiro d' O Amor, E soube, naquele preciso instante, que era o seu que tinha acabado de chegar à cidade e tinha aterrado ali para os lados do Becco dos Assucares. Era para lá que ele ía. Era urgente. Era já.


domingo, 26 de julho de 2009

Rua das Galvôas

Não peças que não, que irei mesmo assim
Quero partir, recuperar o meu lugar.
Gosto de ti mas preciso de mim toda.
Vou pintar, escrever, desenhar
Continuar o que sou de miuda.
Vou visitar as minhas saudades.
Sem elas sou metade de Sol
Ou metade de Lua.
Se me dispo de lá vejo-me nua.
Já tão-pouco sou tua…
Amo-te aqui mas lá sou completa
Escrevo-te. Ligo-te. Vê se perdoas.
E Alice lá foi para a Rua das Galvôas.
Estudara foi bom, mas largava Paris.
Toda a gente se espantou da escolha que quis.
Vivera tanto tempo num lugar maravilhoso,
Terra de hipnoses, encontros jocosos, luzes,
ribaltas, passeios a pé,
paragens de luxo pra quem ousa pensar.

Porque vens tu pra aqui morar?
«Que pergunta idiota, pensava consigo,
Vou prolongar o que lá vivi
Com Paris de mão dada escorrego praqui
Évora menina que menina me viu. »
Alice não reagiu. Olhou para si, cerrou os olhos,
escutou o que sentia...
A Rua das Galvôas era a sua melodia!

Rua do Imaginário


Anda danado Artúrico Imaginário. As novas molas das portas da sua rua estão sempre a partir! E, já se sabe: a rua do Imaginário não existe sem as portas fechadas. Já foi convocada para amanhã de manhã, à primeira hora, uma reunião com o chefe da manutenção, o fornecedor das molas das portas e o patrão Imaginário. Então se avaliará – entre os três – o problema.

Uns dizem que se deve ao cada vez maior número de visitantes da rua e daí, a canseira do material. Artúrico acha que foi a partir do momento em que passaram a fabricar as molas na China, começaram os problemas.

Sem as portas fechadas, a rua não funciona. É preciso entrar para se imaginar. Se não tiver portas, a rua vê-se, logo, não se imagina. Se não se imaginar, como poderá ser do Imaginário? Passaria seguramente a pertencer ao seu grande rival nos negócios, Albino Realista, pioneiro na rua de portas abertas. É claro que não atingindo a qualidade só possível no Imaginário. Mas hoje os visitantes parecem preferir padrões, até há bem pouco, inimagináveis.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Travessa da Anna da Silva


Acabara de desligar o telefone e sentiu cair uma lágrima. Uma única lágrima grossa pelas faces, lívidas da notícia que acabara de chegar. Uma tragédia, o fim-do-mundo, uma ecatombe. Um formigueiro subiu-lhe pelas pernas acima. Uma estranha leveza, um arrepio no baixo ventre e não teve outro remédio senão deixar-se cair na senhorinha desconfortável da avó, que estava encostada desde 1824 à parede do corredor dos quartos da casa velha da travessa. 67 anos sem sequer uma noticiazinha, uma carta, um telegrama, um pombo-correio que fosse. Uma vida inteira a achar que ele se tinha passado para o lado-de-lá, no naufrágio fatal ao largo da Madeira. Notícia de primeira-página dias a fio, em todo o lado. Meses na capa do Diário do Sul, com conversas e demandas e diz-que-disse até a coisa morrer por falta de alimento, sem se perceber bem como. Depois disso nunca mais se falou no assunto. 67 anos a acordar a meio da noite, assombrada pelo fantasma do seu Manoelinho que lhe aparecia nos sonhos e a deixava com suores em bica e as faces ruborizadas dum nunca acabar de prazer que nunca sequer tinha sentido. Anos a fio na abstinência de rendas de bordados, de véu preto de viúva nas missas da Sé, com a piedade das amigas por perto nos chás da caridade. 67 anos de viuvez e agora isto. Um telefonema a meio da tarde e uma vida inteira pelo ralo da varanda, sugada pelo fundo dos tempos. Era agora que Manoelinho tinha desaparecido. Qual naufrágio, qual carapuça. Só agora. Para o quinto dos infernos, depois da bandidagem de ter dado à costa, soube-o também, lá em Porto Santo, onde dedicou, diligentemente, uma vida cheia aos arranjos florais e outras delicadezas de mãos finas, deixando agora só, inconsolável e viúvo o Gilberto Valdevinos, que teve o infeliz desplante de lhe dar de viva voz a noticia do seu fim, por entre soluços e saudades. Anna da Silva não suportou mais. Naufragou ali mesmo num suspiro de vergonha e foi apressada para o céu, desvairada e decidida a dar cabo das finuras do artista que lhe desgraçou a vida.

Travessa do Manoelinho

Grande era o misterio! Não havia registos. Havia ainda um velhote que poderia saber. Porém, tinha perdido o falar em tantas horas consigo próprio. Quem teria sido o Manoelinho? Miúdo não parecia ser. Porque ninguém põe nome de miúdo a uma rua. Por mais pequena que ela seja. E se fosse seria, Manelinho. Como o amigo da Mafalda do Quino. Lembram? Aquele da mercearia, com o cabelo espetado e com talento para os negócios. Uma espécie de gestor em empresa com posição dominante (i.e. EDP ou PT). Um Águia.

Pela antiguidade da toponímia, excluía-se desde logo, qualquer homenagem ao outro Manelinho famoso. Também este da Mafalda, da Mandala. Lembram? O ministro aficionado. Apesar desta condição, a edilidade, ainda não teve tempo, sequer, para ponderar sobre a oportunidade.

Verdadeiramente intrigante. A pista do Manuel com O parecia a única com réstia de esperança. Seria apelido? Diminutivo em apelido tão pouco é habitual. Haveria alguma porta ou janela Manuelina naquela rua? Mas se a rua era estreita e de poucas janelas, o que lá faria uma abertura tão amaneirada? O povo chamaria – naquelas confusões fonéticas das erudições – Manoelinho ao Manuelino?!

Um dia, já ninguém se preocupava com o assunto, no decorrer da Gay Parade promovida pelas forças mais progressistas da cidade, um dos carros alegóricos homenageava o primeiro dos homens da cidade que tinha, passo a citar – “assumido a sua orientação sexual sem olhar aos olhares discriminatórios do seu tempo”. No carro um gigantone de saliente musculatura sentado de joelhinhos juntos ondulava uma bandeira multicor e proclamava na ajustada t-shirt: D. Manoel – O 1º.

Becco dos Assucares

Débora era alegre, bonita, inteligente.
Só tinha uma doença que era amar toda a gente.
E começava a notar-se.
Fugiam. Tinham medo que aquilo se pegasse.
Ou, pior, que se pagasse.
Ela entendia o que lhe acontecia.
Aquilo era doença que ninguém conhecia.
Correu médicos, especialistas, curandeiros e bruxos.
Mas não havia cura. Nenhum caso igual ao seu.
Então Débora mirrou
Encolheu…encolheu. Amargou.
Pintou-se de apagada, desapareceu.
Trocou o seu nome por Camafeu.
Vestiu-se de pássaro e voou sem caminhos.
Voou livre, sem pressa, cheirou o mar e cheirou terra.
Até que, espreitando entre mil voadores, descobriu.
Refez-se pessoa e desceu.
Débora Camafeu estava deliciada.
Tinha vislumbrado uma morada encantada.
“O o o o vosso Be be bec c c o, dos Asss ass sssucares, por favor?”
- Vosso? Aqui só há um beco com esse nome.
E não é nosso, é seu, é de quem quiser.
Chama-se Beco dos Açucares mas que lhe saiba ao que mais gostar.
“Al al algoo go dão!!!” , gaguejou em grito.
E depois riu, riu, riu, sonoramente.
Ali ficou. Amou sem cerimónia, que ninguém notou.
Tinha encontrado a cura em algodão doce.
Num beco com uma enorme saída
Porém nunca a procurou.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Travessa do Capitão

Não era nome de rua. Era de prato. Esguio, mas prato. Que bem se comia em casa do Capitão! Também Capitão não era posto. Nem patente, sequer! Era parente – isso sim – de um antigo oficial de cavalaria, bruto, mas de grande prestígio. Quer na terra, quer na corporação. Como ia dizendo, Capitão era apelido.

Então, nem era rua nem lá morava ou havia morado, qualquer militar. Também não era ele que tinha os dotes culinários. Este homem, que parecia um equívoco, gerava ainda mais. Vejamos: travessa de loiça que não artéria da cidade; prato esguio e prato estreito. Mas não é de porcelana nem de faiança. Do que se trata, são os famosos Pezinhos de Coentrada do Sr. Capitão servidos em travessa e não em prato redondo e coberto como pertence no Alentejo. Prato pesado, mais próprio do frio que do estio.

Embora não fosse capitão de patente, tinha um impedido. E o impedido, embora o fosse, sempre disponível para exibir os seus argumentos de cozinheiro. Ele conseguia fazer lagosta de abrótea – dizia-se à boca pequena para não ferir a generosidade do Capitão, hospitaleiro e vaidoso do seu grande tesouro, o seu empregado. É que, na Travessa do Capitão, a hospitalidade e a convivialidade são as donas da rua.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Travessa da Caraça

Joãozinho estava chateado. Roído de inveja. Nada a fazer. Aquele estropicio-empertigado-armado-aos-cucos do Nelito tinha conseguido cravar a madrinha Teodora de Jesus para lhe comprar a única, inacreditável, assustadora e medonha caraça do mafarrico, que ele estava a cirandar há mais de um mês, enquanto congeminava o resto da fatiota com que iria assustar a Professora Leontina, rapariga de 57 anos feitos a ensinar meninos ranhosos com uma paciência de missionária.
Aquela história de ter querido esperar por fazer 8 anos e receber o envelope da avó Matilde com a nota de 500 paus, tinha corrido mal. O mostrengo do Nelito, por dois dias, passou-lhe a perna.
Joãozinho estava de gatas. Muito enervado. Tanto namoro. Tanta vista da montra. Tanta expectativa. Tanto entusiasmo para nada. Ele que até nem era parvo nenhum e que numa das vindas da escola podia ter puxado da sua melhor compustura, em bicos-de-pés, de risca ao lado aprumadinha e pedido com um sorriso de orelha-a-orelha à velha Gestrudes Sardinha que lhe guardasse aquela coisa medonha, até que lhe chegasse, no envelope azul, a prenda da avó. Erro imperdoável achar que só os seus olhos brilhavam para aquela horrenda feiosidade da montra do carnaval.
Afinal o idiota do Nelito feio como o caraças, com as suas duas favolas da frente a sairem das beiçolas inchadas, o cabelo de piaçaba, o ranhoca verde sempre a espreitar na ponta do nariz batatudo e as proeminentes orelhas de abano levou-lhe a melhor. Malfadado estupor. Podia ter sido o Xico, ou o atadinho do Pedro, ou mesmo o brutamontes do Tózé, agora o Nelito...todos menos ele! Era o único míudo da escola que não precisava de se mascarar e foi logo ele quem lhe estragou o carnaval.


Rua dos 3 Senhores

Não que a Rua dos 3 Senhores não tenha lá outra gente,
Nada disso. Tem moças lindas e alguns jovens até.
A cidade já não é só cidade, é terra dos homens do mundo.
Dizem agora que sim. Mas quem faz dela o que é?
São os Senhores, senhores! O Joaquim, o Manel e o José.
A Inácia, a Rita , a Salomé.
É quem lá vive que sabe.
Não é terra de doutores, é terra de mil amores.
Foi ali que o Joaquim se sentou e pensou: eu quero ir ver o mar.
Quero meter-me na água, saber que prazer isso dá.
Ao que a Inácia reagiu: então escolhe, coração, ou ela ou eu
Que daqui não saio não.
Joaquim foi em excursão, molhou o pé e disse.
Nem pensar, que frio, que chatice, tanto salpico de gente
Vou prá sombra já depressa.
Lá na Rua dos 3 Senhores
Estreitinha e escorreita, chove no Verão folha branca
Pétalas que caem cansadas dos seus vasos nas portadas
Janelinhas encantadas, debruadas pela cal
Não há beleza igual seja Inverno ou seja Verão.
E ali mesmo Joaquim pede a mão à sua amada.
Ela que diz. Pedes-me a mão, meu amor?
Dou-te até o coração, que sem ti não é nada!

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Travessa Sezinando Roiz

Fazia hoje 18 anos. O tio Alberto empunhou a Mont-Blanc que o avô Rodrigo Roiz lhe deixou em testamento. Abriu a gaveta do meio da escrivaninha, enquanto deixava deslizar um pouco a sua proeminente barriga para dar espaço à coisa. Sacou do livro de cheques.
Um leve sorriso de soslaio e logo o ar solene lhe carregou o semblante. Puxou um envelope branco, de papel couché, de debaixo do mata-borrão. Levou o cigarro à boca e deu uma baforada lenta.
Sezinando olhava a cena hirto, sem pestanejar, como bem lhe mandava a educação esmerada da família Roiz, enfiada nos seus genes desde os idos de quinhentos, quando serviam el-Rei nas demandas por novas terras. Hirto e expectante sem perceber que raio o tio Alberto estaria a preparar. Pensou nas férias, na Constança, na patuscada que podia fazer com o cheque que o tio se preparava para lhe dar. Arrefeceu a seguir, quando se lembrou da fama de sovina do Sr. D. Alberto, conhecido como a criatura mais pelintra da cidade.
Sério, Alberto Roiz começou por rabiscar primeiro uma morada num papel. Depois, mais acima, escreveu um nome, em letra arredondada, enquanto por baixo do farfalhudo bigode ia humedecendo vagarosamente os lábios e deixava que se rasgasse um sorriso. A seguir, com a solenidade própria que lhe assistia por ser o morgado de Roiz, escreveu caligraficamente cada letra e número num cheque verde, muito bem visto e revisto. Dobrou-o e meteu-o no envelope. A seguir lambeu a cola com malícia, fechou-o levemente e deu-o a Sezinando enquanto lhe agarrava calorosamente ambas as mãos.
Olhou fixamente os olhos do rapaz. E pronunciou com voz matreira - Sezinando, meu rapaz, hoje é um grande dia para ti. 18 anos feitos. Já estás um homenzinho. É altura de experimentares a vida desta terra. Desces a Rua de Machede, que bem conheces, e lá ao fundo, quase no final, viras para a Travessa do Diabinho. Chama-se Rafaela. Entrega-lhe esta carta que ela está à tua espera. Desejosa de te conhecer.

domingo, 12 de julho de 2009

Travessa do Landim


Ela não era nova nem velha. Era assim sem idade alguma.
Também não era bonita nem feia. Era assim sem pormenor.
Não tinha nome. Esqueceram-se de lhe dar um nome, os pais.
Ficou ali, quando nasceu. No hospital. E chamaram-na de menina.
A menina sem idade que não era bonita nem feia e sem pais e sem nome
viveu sempre no ar, sem os pés no chão.
Não voava, pairava. E era assim também quando sonhava.
“para mim só um anjo, caído do céu”.
E não é que esse anjo apareceu?
“de onde vens?”
- Venho da Sé. Mas não voei, vim a pé. Pisei pedra, pisei calçada, vim na tua alçada.
«a menina assim e assim? Vive acoli, na Travessa do Landim».
- Sonhei-te, amei-te no teu sonho…e vim!