sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Rua da Cal Branca



Artúrico Imaginário, o da Travessa, discorria, um dia destes, sobre as eventualidades da vida portuguesa. Como se trata de um Imaginário, nunca – mas jamais! – discorre sobre a actualidade. O único que o ocupa é, a eventualidade. Da sua cabeça emergiam uma série de improbabilidades. Porém, como se trata de uma figura muito respeitada em Évora, a pequena audiência, à sua volta no café, escutava embevecida como quem escuta alguém que poderá arrancar a sua existência, à vil tristeza do passar dos dias, um sobre o outro, sem que mais nada se passe, que o empobrecimento próprio e dos próximos. A televisão, ao fundo e por isso, em fundo, apresentava as declarações sempre fantásticas de um ministro, à saída da inauguração de um certame de pesca desportiva, perante o desinteresse de todos, excepto de Albino Realista e de quem o acompanhava, o presidente da distrital do partido do governo, com um pé engessado. Recorde-se que o empresário Realista é grande pescador de achigã; o seu amigo, político local, é mais da pesca, em geral.



Imaginário falava que lá para o Natal, o ex-conselheiro de Estado, Dias Loureiro seria reintegrado com a aclamação dos seus pares e que o Prof. Marcello quase explicaria na TV, não fora a sua escrupulosa obrigação de respeitar, “o silêncio dos conselheiros”. A outro, duvidando da velocidade da justiça pela amostra do caso Casa Pia, Imaginário garantiu que Silvino seria o único condenado. Os demais réus mandados em paz para casa e só não seriam convidados para desempenhar cargos de elevada responsabilidade, porque estão a atingir o limite de idade. A propósito, falou-se na indemnização do director de programas da TVI, num claro desvio às preocupações de Imaginário.



Os escândalos bancários estarão praticamente resolvidos na opinião de Imaginário antes da primavera. Só o administrador nomeado pelo Banco de Portugal para tomar conta do Banco Privado andará a contas com a justiça por erros processuais e provavelmente será detido preventivamente. Aos investidores que aplicaram o seu capital em produtos de elevado risco, o Estado, “num alarde de pujança financeira e solidariedade social para com os sectores mais dinâmicos da sociedade”, garantirão 100 % do capital investido com a compra dos activos tóxicos e com o maior “desprendimento na acção”, repartirão a mais valia eventualmente gerada, na esperada recuperação dos mercados. O presidente/fundador do BP era apontado, no “fervilhante meio financeiro de Évora” como um fortíssimo candidato à presidência da Caixa. Não da Caixa de Crédito Agrícola. Antes da grande, da propriamente dita, Caixa Geral de Depósitos. A dúvida – diz-se – está no modelo de governance defendido pelos dois partidos. Enquanto os socialistas defendem o actual modelo atribuindo claramente a presidência executiva ao ex-banqueiro, o PSD estaria mais inclinado em atribuir a Presidência do Conselho de Administração (Chairman), com funções de índole mais estratégica. A Imaginário caía-lhe melhor a segunda solução para não subaproveitar as ideias de alguém com quem ainda se diz, aparentado. Aliás, ele garantia, porque crê conhecê-lo bem, que os directores dos mais importantes media serão chamados à sua (dele) casa do Estoril para num pequeno-almoço, transmitido em directo pelas televisões, serem revelados os projectos para o banco de capitais públicos.



Ora a Rua da Cal Branca é por causa dos Imaginários desta vida. Foram os amigos do Realista, mais papistas que o Papa, que lhe puseram o nome. Afinal, eles tinham pavor que o Imaginário tivesse razão e não fosse a cal ganhar outras cores.

Sem comentários:

Enviar um comentário