terça-feira, 2 de março de 2010

Travessa do Açacal

João Vago era seu nome. Lembrava-se vagamente dos seus clientes. Naquela profissão não eram permitidas descrições precisas dos fregueses. Homem de poucas falas, mais valia prevenir, o que não tinha remédio depois de feito. Mais vale, língua presa que dependurada. Pela sua casa passava toda a sorte de gente. Do respeitabilíssimo oficial de cavalaria, ao salteador de caminhos, passando pelo castrador de animais, todos queriam que o Vago lhes afagasse os metais.

Hoje, o açacal deu lugar a um minimercado. As lâminas são todas descartáveis. O polidor de armas brancas – o açacalador – já lá não está e o mais parecido é o amolador ambulante que – dizem – agoira chuvas com a sua gaita. Arranja mais varetas do que afia facas. Não ganha para acompanhar um cego.

A descartabilidade está na moda, há demasiado tempo. Nem as barbas se fazem; e quando as fazem, não usam navalha. Ninguém faz açacaladuras, nem sequer vagamente. Será um problema de afectos?

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